Em 16 de janeiro de 2009, chegava ao fim a novela “A Favorita”, de João Emanuel Carneiro, com direção de Ricardo Waddington. Antes de ganhar o Brasil com “Avenida Brasil” (2012), o autor estreava na faixa mais nobre da Globo com uma novela ousada, experimental e muito mais soturna que a popularesca trama do Divino.
“A Favorita” estreou trazendo um conflito inédito no centro da narrativa: duas rivais, ex-amigas de infâncias e que foram até mesmo uma dupla sertaneja na juventude, se acusavam mutuamente por um crime cometido no passado. Apenas uma estava dizendo a verdade. Uma delas havia matado Marcelo Fontini (Flávio Tolezani), o rico marido de Donatela (Cláudia Raia) e amante de Flora (Patrícia Pillar), que ficou 18 anos presa pelo assassinato, jurando ser inocente.
A novela brincou, no início, com as falsas impressões das pessoas sobre o bem e o mal. Flora era uma mulher doce, angelical e com aparência inofensiva. Donatela era uma perua deslumbrada, um pouco arrogante e fútil, que vivia para tentar minar uma aproximação de Flora com a própria filha, Lara (Mariana Ximenes). A jovem, fruto do romance de Flora e Marcelo, fora criada por Donatela.
Virada em A Favorita
Em dado momento da história, Flora consegue conquistar a confiança da família Fontini, e destrói a reputação de Donatela. Neste momento, o público vê Flora admitir que fora, de fato, a autora dos tiros que acabaram com Marcelo no passado. Em seguida, a personagem não hesita em cometer um novo crime: mata o médico Salvatore (Walmor Chagas) e faz com que Donatela seja presa pelo delito.
A virada, que expôs ao público uma novela mais tradicional e maniqueísta (em que a agora mocinha Donatela lutava para desmascarar a vilã Flora) passou a chamar bem mais atenção do público. Cruel, psicótica, sem qualquer resquício de humanidade, Flora foi uma das vilãs mais macabras e memoráveis da história da TV.
Dentre as cenas mais marcantes da novela, estão a que Flora mata Gonçalo (Mauro Mendonça), o pai de Marcelo, de susto. A vilã convence o empresário, utilizando um roupão sujo de sangue, de que matou sua mulher e sua neta, Lara, a facadas. O coração de Gonçalo não resiste ao circo de horrores armado pela psicopata.
No final da trama, Flora volta para a cadeia afirmando para todas que seu nome é Donatela. A cena final da história reforça a obsessão patológica que guiou a narrativa: em um flash-back, Flora, criança, afirma a Donatela: “você é a minha favorita”.
As atuações de Patrícia Pillar, até então acostumada a personagens boazinhas, e de Cláudia Raia, mais relegada a tramas leves e cômicas, chamaram muito a atenção. Destaque também para o malandro Dodi (Murilo Benício) e o traiçoeiro Silveirinha (Ary Fontoura), além do casal cheio de química formado por Lara e Halley (Cauã Reymond em seu primeiro papel mais maduro).
Tramas paralelas de A Favorita
As tramas secundárias, é verdade, ficaram um pouco ofuscadas com relação à história central. Um núcleo envolvendo corrupção na política e tráfico de armas, tendo Milton Gonçalves e Taís Araújo, não vingou. Os conflitos da família de Copola (Tarcísio Meira), que morava na vila industrial da cidade ficcional de Triunfo, também não chamaram tanto a atenção, com exceção dos dramas de Catarina (Lília Cabral), sua filha mais velha.
Dona-de-casa sem ambição ou vaidades, Catarina é frequentemente humilhada e desprezada pelo marido beberrão, Léo (Jackson Antunes), que a espanca. Sua virada se dá quando ela se separa do traste e passa a trabalhar no restaurante de Stela (Paula Burlamaqui), forasteira lésbica que se apaixona pela amiga.
A polêmica deste núcleo se deu pela misteriosa gravidez precoce de Mariana (Clarice Falcão), filha de Léo e Catarina, que se recusa a revelar à família de quem está grávida. No último capítulo, uma discreta revelação: Léo, após passar um tempo preso por tentativa de estupro contra Stela, tenta se reaproximar de Mariana, mas a filha o rechaça. Teria sido ele quem violentou a adolescente.
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