O Brasil perdeu nesta terça (26) um dos maiores nomes de sua teledramaturgia: o escritor Gilberto Braga faleceu aos 75 anos. Bernardo Araújo, sobrinho do dramaturgo, afirmou que o tio estava internado desde a última sexta (22), em razão de uma perfuração no estômago e “vinha há alguns anos com vários problemas de saúde e passou por uma cirurgia na coluna, uma no coração e uma hidrocefalia, já vinha apresentando dificuldades para andar. Aí ele acabou indo para o hospital na semana passada. Ele foi internado já bem mal, e lá foi constatada uma infecção generalizada por conta da perfuração no esôfago.”
Gilberto Braga deixa como legado algumas das mais inesquecíveis novelas de todos os tempos, como “Vale Tudo” (1988), obra que desenvolveu em parceria com Aguinaldo Silva e Leonor Basséres e que discutiu a honestidade do brasileiro contrapondo a mãe honesta – Raquel (Regina Duarte) com a filha inescrupulosa – Maria de Fátima (Glória Pires). A lendária vilã Odete Roitman (Beatriz Segall) também foi criação sua.
Braga era conhecido por retratar em suas novelas deliciosas crônicas da elite carioca, levando sempre pertinentes críticas à corrupção e ao “jeitinho brasileiro” de se subir na vida de modo fácil. Suas tramas costumavam contar com os famosos “quem matou?” para agitar as narrativas na reta final.

Gilberto Braga escreveu, em 1976, uma das primeiras novelas da Globo a se tornar recorde de exportação: “Escrava Isaura”, folhetim inspirado no romance homônimo e que trazia a saga de Isaura (Lucélia Santos), escrava branca vítima do assédio do vilão Leôncio (Rubens de Falco). O sucesso arrebatador da novela o promoveu ao horário nobre, onde marcou época.
Sua primeira história para a faixa das 20h foi “Dancin Days” (1978), uma ode à era da discoteca e que trouxe a emblemática rivalidade entre as irmãs Júlia Mattos (Sônia Braga) e Yolanda Penteado (Joana Fomm). Um remake do folhetim foi ventilado em 2012, mas nunca saiu do papel.

Entre 2003 e 2004, o Brasil parou para acompanhar sua última novela-solo: “Celebridade”, uma crítica ao jornalismo sensacionalista e à busca desenfreada pela fama, norteada pela implacável vingança da vilã Laura (Cláudia Abreu) contra a empresária do show business Maria Clara Diniz (Malu Mader), de quem se aproxima fingindo-se de admiradora para depois ocupar seu lugar. A novela teve como inspiração o clássico do cinema “A Malvada” (1950). Uma das cenas mais memoráveis da trama foi a que a heroína dá uma surra na megera no banheiro de uma casa noturna.
Os espectadores do canal por assinatura Viva podem conferir, atualmente, a reexibição de “Paraíso Tropical” (2007), sucesso que desenvolvera em parceria com Ricardo Linhares, tendo no centro da narrativa as gêmeas e rivais Paula e Taís (Alessandra Negrini) e marcada pelo casal bandido Olavo (Wagner Moura) e Bebel (Camila Pitanga). A obra foi indicada ao Emmy Internacional de Melhor Telenovela em 2008, mas não levou a estatueta.
A última novela de sua carreira foi a problemática “Babilônia” (2015), desenvolvida também com Linhares e com João Ximenes Braga. A novela amargou o pior índice de audiência da faixa das 21h e sofreu rejeição do público conservador ao exibir, no primeiro capítulo, uma vilã ninfomaníaca, o beijo lésbico entre duas idosas e o submundo da prostituição. A trama também fazia fortes críticas a políticos evangélicos fundamentalistas, através do corrupto e homofóbico pastor Aderbal Pimenta (Marcos Palmeira), prefeito da cidade fictícia de Jatobá.

Gilberto Braga tinha engatilhado um projeto de retornar para o horário das 18h – de onde estava afastado desde 1999, quando escreveu a elogiada “Força de um Desejo”, em parceria com Alcides Nogueira. O dramaturgo desenvolveria uma versão folhetinesca para o filme de época “Feira de Vaidades” (2004), trazendo uma anti-heroína capaz de tudo para subir de vida no centro da história.
A produção, contudo, fora recentemente cancelada em razão de uma decisão estratégica da alta cúpula da Globo em não trabalhar com novelas de época pelos próximos anos, em razão das dificuldades em se investir nesse tipo de formato, devido aos protocolos sanitários adotados com a pandemia da covid-19.
Gilberto Braga deixa em seu legado também elogiadas minisséries, como “Anos Dourados” (1986) e “Anos Rebeldes” (1992), bem como sua marca registrada e sua parceria sempre frequente com muitos artistas consagrados: além do diretor Dennis Carvalho, outros queridinhos de Braga eram atores como Malu Mader, Glória Pires, Claudia Abreu, Deborah Evelyn, Camila Pitanga, Fábio Assunção, Antônio Fagundes, Nathalia Timberg e Cássio Gabus Mendes.
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