Nem sempre os autores conseguem seguir o que haviam inicialmente planejado para suas novelas. Por problemas de bastidores ou audiência, algumas tramas precisam modificar seus enredos e algumas trajetórias de personagens.

Caminho das Índias
A novela de Glória Perez tinha no centro da narrativa o amor proibido entre os indianos Maya (Juliana Paes) e Bahuan (Márcio Garcia) — ele era considerado intocável pelo sistema de castas da Índia. No entanto, a química entre o casal principal era zero. Para que a audiência reagisse, a autora teve que interferir na história.
Na trama original, Maya se casaria com Raj (Rodrigo Lombardi) obrigada pela família e logo veria o marido morrer. A mocinha também viveria no Brasil e estaria diretamente relacionada à trama da família Cadore, que é vítima de um golpe da ardilosa Yvone (Letícia Sabatella). No primeiro capítulo, Maya, como atendente de call-center, é quem faz a transação em que Raul (Alexandre Borges) desvia milhões da empresa familiar para um paraíso fiscal.
Tal ponta ficou solta na novela que foi ao ar, porque o público passou a torcer para que Maya e Raj se entendessem. O casal esbanjava química. Na reta final da trama, o novo mocinho da história de fato “morreu” em um acidente de trem, para total sofrimento de sua mulher. Mas no último capítulo, Raj se levantou do mundo dos mortos e levou Maya de volta para casa, em um final feliz inesquecível.

Morde & Assopra
A trama de Walcyr Carrasco trouxe a mescla do passado e do futuro através de uma personagem paleontóloga, que estudava ossadas de dinossauro, e um cientista que criava robôs. Júlia (Adriana Esteves) e Ícaro (Mateus Solano) viram suas tramas serem modificadas e as temáticas científicas praticamente morreram.
A novela passou a girar em torno do melodrama de uma personagem coadjuvante, a faxineira Dulce (Cássia Kiss Magro), rejeitada pelo filho Guilherme (Klebber Toledo). Para não desaparecer, a protagonista Júlia foi inserida como amiga e conselheira de Dulce. A robô Naomi (Flávia Alessandra) desapareceu e a Naomi original, de carne e osso, surgiu para enredar uma trama de mistérios e intrigas.
Somente no final é que Júlia chegou ao vale pré-histórico onde ainda existiam dinossauros vivos, conhecido como o centro da terra — pesquisa que a mocinha conduzia no começo da novela. As mudanças surtiram efeito significativo na audiência.

Torre de Babel
A história de Sílvio de Abreu não modificou exatamente sua história, mas adiantou muita coisa. O grande conflito da trama era a explosão do shopping Tropical Tower, mas o autor teve que antecipar o crime misterioso em muitos capítulos e aproveitou a tragédia para eliminar personagens problemáticos, que afugentavam o espectador mais conservador.
As lésbicas Leila (Silvia Pfeifer) e Rafaela (Christiane Torloni) e o dependente químico Guilherme (Marcello Antony) morreram na explosão. Na sinopse original, apenas Rafaela morreria, e a viúva Leila desenvolveria uma bonita amizade com Marta (Glória Menezes), o que discutiria o preconceito acerca de amizades entre gays e heterossexuais.
O medo de uma má interpretação sobre a relação das duas personagens levou Abreu a matar também Leila. O anti-herói Clementino (Tony Ramos) foi suavizado e ganhou um par romântico tradicional com Clara (Maitê Proença), o humor foi acentuado e a trama policial ganhou ritmo e fôlego a partir daí.

Babilônia
A mais rejeitada das novelas da Globo causou muita repercussão negativa entre os conservadores por exibir, em seu primeiro capítulo, uma vilã ninfomaníaca e assassina contumaz, um beijo lésbico entre duas idosas e uma filha dando uma bofetada na própria mãe.
A psicopata viciada em sexo Beatriz (Glória Pires) se apaixonou pelo garotão Diogo (Thiago Martins), a prostituta ambiciosa Alice (Sophie Charlotte) se tornou uma mocinha romântica e ingênua, os beijos gays entre Nathalia Timberg e Fernanda Montenegro foram suprimidos e o galã homossexual Carlos (Marcos Pasquim) se tornou, subitamente, hétero e par romântico da heroína Regina (Camila Pitanga).
Também foi adiantado o motivo pelo qual as vilãs Beatriz e Inês (Adriana Esteves) se odiavam tanto, mas mesmo assim, de nada adiantou. A novela foi considerada um Freinkstein que não vingou.

Tempos Modernos
A bizarra novela de Bosco Brasil era um dramalhão com doses de realismo fantástico e ficção científica que substituía a comédia romântica convencional “Caras & Bocas”. Não agradou. A vilã Deodora (Grazi Massafera), segundo a sinopse, seria uma robô. A interpretação da atriz estava, de fato, robótica. Deodora se humanizou e até mesmo se apaixonou por Portinho (Felipe Camargo).
O robô inteligente Frank, que era amigo e conselheiro do protagonista Leal (Antônio Fagundes), e vigiava todos os moradores do edifício Titã, sumiu da história, que passou a investir em dramas e romances. O vilão Albano (Guilherme Weber) morreu logo no começo, abrindo espaço para os conflitos familiares de Leal com suas filhas e com a ex-namorada Hélia (Eliane Giardini). De nada adiantou.

Amor à Vida
O folhetim de Walcyr Carrasco foi marcado pelo sucesso do vilão gay Félix (Mateus Solano), que fazia de tudo para infernizar a vida da irmã, a mocinha insossa Paloma (Paolla Oliveira). A ideia original era que o malvado descobrisse uma séria doença autoimune.
O patriarca César (Antônio Fagundes) morreria de infarto, na cama com a amante Aline (Vanessa Giácomo), tão logo descobrisse que os crimes do herdeiro. A vigarista disputaria o comando do hospital com a viúva Pilar (Susana Vieira). Já a periguete cômica Valdirene (Tatá Werneck) se tornaria uma cantora evangélica.
Félix se redimiu de suas maldades e se tornou o grande herói da novela: teve direito a romance e final feliz com Niko (Thiago Fragoso). César continuou vivo e destilando sau homofobia contra o filho, até ter um final redentor ao lado de Félix. Aline se tornou a grande vilã e enganou César até o fim. Já Valdirene continuou no núcleo cômico e em busca de um golpe do baú, enquanto a convertida evangélica da vez foi Gina (Carolina Kasting).

Pátria Minha
Essa malsucedida novela de Gilberto Braga não só foi rejeitada pelo público, como atravessou problemas nos bastidores. Vera Fischer era a protagonista Lídia. Na vida real, ela era casada com Felipe Camargo, que também participava do folhetim. Os dois chegavam atrasados, brigavam muito nos bastidores e eram grosseiros com outros profissionais.
A saída encontrada pelo autor foi matar os personagens dos dois em um incêndio. Vera Fischer saiu da Globo, na época, cuspindo marimbondos e sobraram ofensas até para Tarcísio Meira, seu par romântico na novela, a quem chamou de “velho caquético”.

Império
Outra novela marcada por imprevistos nos bastidores foi essa de Aguinaldo Silva. Cabia à atriz Drica Moraes a missão de encarnar Cora, a grande vilã da trama. Com problemas de saúde que a impediam de gravar cenas mais complexas, a artista acabou sendo afastada na metade e Silva recorreu a Marjorie Estiano, que havia feito Cora na primeira fase, para ressurgir como a megera “rejuvenescida”.
A saída só serviu para que Cora tivesse um final, já que a trama central já havia sido comprometida. O autor teve que inserir um novo vilão misterioso, Fabrício Melgaço, um inimigo do Comendador (Alexandre Nero) que queria destruí-lo. Já o triângulo amoroso formado por Cristina (Leandra Leal), Vicente (Rafael Cardoso) e Clara (Andreia Horta) foi incrementado com doses de vilania na terceira: como o público torcia mais para ela do que para a mocinha de Leandra, o autor precisou transformar a designer numa megerinha.

Por Amor
A sinopse original de Manoel Carlos previa a morte da mocinha Eduarda (Gabriela Duarte). Frágil e com a saúde bem debilitada, ela se afastaria de Helena (Regina Duarte) para tentar um tratamento com Marcelo (Fábio Assunção) nos EUA. Antes de morrer e com medo de que Marcelinho fosse criado por Laura (Vivianne Pasmanter), a moça se reaproximaria da mãe.
Em seus últimos dias de vida, Eduarda pediria que Marcelo deixasse Helena criar Marcelinho. O rapaz passaria por uma grave depressão, não só pela viuvez, como pelos problemas da empresa da família, que passaria a ser tocada por Léo (Murilo Benício). Helena terminaria a história sem contar a ninguém sobre a troca de bebês que fizera na maternidade para evitar o sofrimento de Eduarda.
“Houve coerência do destino. Se Helena sofreu e perdeu um filho para fazer sua filha feliz, Maria Eduarda morreu para devolver à mãe a criança que de fato lhe pertencia. De uma maneira ou de outra, fez-se Justiça”, frisava Maneco ao fim da sinopse da trama.
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